sexta-feira, 2 de maio de 2014

Como a ideia da vida no céu influencia a vida na terra

Tropecei numa notícia
antiga: http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/europe/ireland/9679840/Pregnant-woman-dies-in-Ireland-after-being-denied-an-abortion.html

A uma indiana a viver na Irlanda foi negada a possibilidade de realizar um aborto, apesar de ser óbvio que a sua vida estava em risco..  O motivo pelo qual negaram a esta mulher escolher continuar a viver:
"A Irlanda é um país católico"

Sempre que me cruzo com pessoas que acham que é necessário sacrificar a vida terrena de alguém em favor da sua vida eterna no céu, sinto um desejo que compreendo ser irracional e deletério, de as ajudar a chegar lá mais depressa!

A hipocrisia é monumental!

Foi com surpresa e horror que li o livro "Posição Missionária" de Christopher Hitchens, sobre a vida e obra de uma figura geralmente acarinhada, inclusivamente por mim (antes de conhecer os factos): Madre Teresa de Calcutá.

Hitchens descreve o pardieiro onde ela mantinha os pobres, uma casa decrépita sem condições, onde os medicamentos escasseiam em numero e género apesar de esta ter recebido milhões de euros em donativos um pouco por todo o mundo.

Entre outras praticas, somos apresentados à recomendação de "batizar às escondidas pessoas no leito da morte", uma prece forçada, muitas vezes sobre pessoas que se sabia serem de outra religião, em favor da eternidade no céu católico. Conhecemos os detalhes de várias situações em que foi negado acesso a recursos médicos, que sabemos terem viabilidade financeira, porque a postura da "casa da morte" era precisamente "ajudar as pessoas a morrer na graça de deus" e não ajuda-las a viver na terra.

O bom relacionamento que mantinha com figuras de moral irrevogavelmente repreensível, o detrimento das condições das instituições a seu cargo em favor da expansão do catecismo...

Na wiki Portuguesa, não há sequer menção às criticas de que foi alvo. O vaticano também deve ter feito ouvidos mocos, porque ela foi canonizada. Talvez por ser uma figura com demasiado peso para desperdiçar.

Quem não tenha paciência de ler o livro, pode sempre dispensar 20 minutos ao documentário. MTC não merece carinho, nem admiração. Talvez mereça pena, simplesmente porque não existem indícios de que em algum momento tenha estado ciente de quão perniciosas eram as decisões que tomou.




A leviandade com que se opina, se decide - sobre a vida dos outros, tomando como premissa a existência de um "ditador celestial"- repugna-me de tal forma que não consigo escrever como.

Nunca ocorre ao "crente" que se o tal deus não existir, é só homicídio por negligência. Esse conceito tão terreno, desconfortável e nefasto... mas pelo menos conivente com a realidade.



quinta-feira, 1 de maio de 2014

Creacionismo/Design Inteligente Vs Evolução || Dogma Vs Cepticismo?

É comum deparar-se com esta afirmação:

Não tenho problema algum em aceitar a teoria da evolução e ao mesmo tempo acreditar em Deus? 

Se pensarmos um pouco sobre o que significa termos evoluído por oposição a ser criados por uma entidade omnisciente, começamos a descobrir questões que põe em causa vários dogmas do cristianismo. Nomeadamente o pecado original. Sem Eden, não existiram humanos perfeitos, portanto ou Deus nos criou imperfeitos, ou não nos criou de todo e neste caso, se existir, será outro deus qualquer.

Ciência e Cepticismo 

Christopher Hitchens já vinha escrevendo com grande sucesso sobre o tema da religião e o seu lado menos “bom”, mas o grande estrondo aconteceu nos últimos anos com a criação da fundação para a razão e a ciência de  Richard Dawkins, que doou o seu “estrelato” à causa de libertar a humanidade do Dogma. O objectivo da fundação não é promover o ateísmo mas sim a ciência e o uso da razão.
Embora seja fácil confundir os dois, sobretudo pela orientação que regra geral tomam os debates. O ponto de partida é o ensino falacioso (ou exclusão em casos extremos) da teoria da evolução em escolas de orientação religiosa, porém dado o que referimos acima isto acaba por agitar a comunidade religiosa que sente, talvez com razão, que a teoria da evolução é uma ameaça à sua visão do mundo.

Está intimamente ligado a outros movimentos como  o “cepticismo”. Notoriamente refira-se, James Randi que há décadas criou o “desafio de 1 milhão de dolares“  comprometendo-se  a entregar esta quantia a quem seja capaz de, num ambiente controlado, providenciar provas de qualquer tipo de actividade sobrenatural. Vários tentaram. Até agora, ninguém conseguiu levar o prémio.

Outras non-profits tem entretanto complementado estes esforços, refira-se por exemplo o “center for applied rationality”   que promove o uso da razão no dia a dia. Alertando para erros de raciocínio comuns e falhas de cognição que todos temos.

Em PT :
Vão surgindo pequenas organizações neste âmbito, embora ainda com poucos membros. Talvez por felizmente, à parte de pequenas anedotas como o Presidente da República deixar escapar em publico que Nossa Senhora tinha ajudado na boa avaliação da Troika.... , não termos escolas "de fe´" patrocinadas com dinheiros públicos, nem organizações dedicadas ao desprezo da ciência.

Comunidade Céptica Portuguesa
Sociedade Ateista Portuguesa



DOGMA


Por oposição a estes movimentos organizados, surgiram também movimentos organizados para defender o criacionismo. Talvez o mais conhecido, por ser também cómico até para grande parte dos crentes. É o museu da criação.


Um espaço onde é possível visitar exposições que ilustram a “história da terra” à luz da (teoria da jovem terra criada) “Young-Earth Creationism”. Segundo Ken Ham o mentor do projecto, os humanos teriam convivido com os dinossauros. Inclusivamente, teriam domesticado os dinossauros. Uma das figuras mais risíveis do espaço é esta:


Outras afirmações intuitivamente falsas incluem:
 - Os dinossauros eram herbívoros.

- A terra tem aproximadamente 6000 anos conforme indicado na biblia.

Recentemente num debate entre Bill Nye (the science guy) e Ken Ham, o primeiro disse ao segundo com alguma graça que existem arvores vivas  com mais anos do que o segundo acredita que o planeta tem de existência.



Curiosamente o mesmo debate que deveria ter acutilado a idiotia envolvente, acabou por aumentar o financiamento disponível para o projecto que agora se aventura na construção de uma réplica da arca de Noé, em tamanho real, avaliada em 150 milhões de dólares.


Outras organizações :
institute for creation research.   Vestido de uma indumentária cientifica, põe em causa o consenso da comunidade cientifica em vários tópicos, sendo o mais frequentemente citado a especiação.
Intelligent Design

De notar também o tipo de linguagem das primeiras para as segundas instituições. Ex. o numero de vezes que ocorre PhD ao referir o nome de algum autor. Regra geral no primeiro grupo, não se referem as credenciais académicas das pessoas envolvidas. No segundo referem-se. De notar também que em qualquer intervenção publica, é comum as pessoas no primeiro grupo precederem opiniões sobre assuntos não directamente relacionados com a sua área, por “Não sou biólogo” ou “”Não sou físico” , enquanto que no segundo grupo nunca ouvi ninguém escusar a “autoridade” das suas credenciais num campo, quando se pronuncia sobre outro. No segundo grupo,  é comum os oradores serem apresentados por quem os cita ou promove unicamente como phD. Como se tirar um doutoramento fosse automaticamente uma certificação de omnisciência.

Nota: Obviamente que a certificação do orador não valida qualquer per si qualquer afirmação que este promova, mas não é absurdo assumir que se alguém estudou alguma coisa durante 10 ou 20 anos, possa ter uma compreensão mais alargada sobre esse tema que outra pessoa que se sentou na sanita ao domingo a pensar sobre isso.  O intuitivo é pelo menos ponderar com mais cuidado uma afirmação que vem do primeiro tipo de pessoa que do segundo. Esta é uma premissa que está no nosso subconsciente… e de que os criacionistas se aproveitam para explorar com descarada desonestidade intelectual.

Ex. David Berlinski um filosofo e matemático. Muito citado por creacionistas, que escreveu vários livros advogando a “complexidade irredutivel“ como argumento contra a teoria da evolução.



Repetidamente revogado por biólogos e até por um matemático conforme ilustra mui claramente este artigo:

HOW ANTI-EVOLUTIONISTS ABUSE MATHEMATICS


Berlinski faz uma interpretação falaciosa do mecanismo de evolução e dele deriva um modelo matemático inapropriado. Na realidade não passa de uma formulação mais sofisticada dos macacos a tentar escrever as peças de Shakespeare. Naturalmente a evolução não pode ser expressa por uma permutação. O autor do artigo acima propõe o uso de cadeias de Markov, que expressam a probabilidade de ocorrência  de uma variável em função de estados anteriores, como sendo mais apropriada para descrever o processo pelo qual organismos evoluem.

O debate tem bifurcado por outros campos, nomeadamente a vacinação, a homeopatia, ou o aquecimento global. Cada um com o seu painel de “cientistas” e estudos falaciosos, com o objectivo de explorar a credulidade que emana da iliteracia cientifica. Se mais nada surgir deste debate cada vez mais institucionalizado, pelo menos será impossível a quem se queira dar ao trabalho de explorar estas questões, não desenvolver um sentido critico que o faça desconfiar de todas as afirmações com que se confronte, especialmente quando elas forem precedidas com grande ênfase pelas credenciais de quem as advoga.


“Os iliteratos do sec. 21 não serão aqueles que não sabem ler ou escrever, mas aqueles que não conseguem aprender, desaprender e reaprender.”
Alvin Toffler